12 de fevereiro de 2008

Motoristas embriagados podem sofrer penalidades mais severas

Novas regras no Código de Trânsito Brasileiro tornam crime dirigir após beber

É comum ouvir diariamente acontecimentos trágicos no trânsito. Santa Catarina é um dos estados brasileiros com maior número de acidentes com vitimas fatais. Para se ter um exemplo, durante os primeiros três dias do feriado de carnaval, o estado liderava em mortes no trânsito, eram 16 entre a noite de sexta-feira, 1º de fevereiro, até a manhã de segunda-feira. De acordo com a Policia Rodoviária Federal, a maioria dos acidentes são provocados por motoristas embriagados, que exageram na velocidade, fazem ultrapassagens perigosas, que resultam em tragédias.
Para reduzir esta triste estatística, o governo federal pretende lançar novas regras para autuar os motoristas alcoolizados. As novas regras de trânsito que o Ministério da Justiça vai pôr em consulta pública nos próximos 30 dias pretendem aumentar muito os valores das multas e tornar mais duras as penas. Os alvos principais são álcool e excesso de velocidade. Não será preciso provocar acidente ou cometer infração, bastará o motorista ser pego dirigindo sob efeito de bebida alcoólica para ter cometido um crime. E não precisa beber muito para virar criminoso: pouco mais que uma lata de cerveja já deixa o motorista fora da lei.
Depois da consulta, o pacote do governo seguirá para o Congresso, em regime de urgência. Se aprovado, o limite de álcool no sangue cai pela metade: do atual 0,6 grama por litro de sangue para 0,3. Pode haver variação de uma pessoa para outra, mas, em média, isso significa autorização para beber mais ou menos uma lata de cerveja. Será mantida a possibilidade de o motorista se recusar a fazer o teste do bafômetro, mas sinais evidentes de embriaguez, com testemunhas, serão suficientes para pegar até 3 anos de detenção e ter a carteira de hab
ilitação suspensa.
Parte das alterações havia sido antecipada pelo ministro da Justiça Tarso Genro no começo do ano, depois do anúncio de que as vítimas nas rodovias federais aumentaram 11% em 2007. "Temos de atualizar o CTB em função do agravamento da violência no trânsito", disse o ministro da Justiça, Tarso Genro. "Mas não queremos impor normas sem debates. Esse é um trabalho preliminar", justifica o ministro.


Penalidades

Pela primeira vez, desde 2000, data que o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) foi aprovado, o governo decidiu reajustar o valor das multas. O aumento será, em média, de 63%. O valor mais alto hoje, de R$ 190, passará a R$ 315. Várias infrações poderão ter esse valor multiplicado em cinco vezes. Segundo o ministro da Justiça, Tarso Genro, é necessário aumentar o valor das multas para conscientizar os motoristas "Temos de atualizar o CTB em função do agravamento da violência no trânsito. Mas não queremos impor normas sem debates. Esse é um trabalho preliminar", relata o ministro.
Uma das propostas que deve causar mais discussão é a que propõe calcular a multa para crimes de trânsito - dirigir embriagado, participar de rachas e reincidir em infrações gravíssimas de excesso de velocidade. Estes crimes podem resultar em uma pena pesada, que pode ser no valor do veículo. A proposta não determina porcentual ou limite, o que significa que o juiz pode determinar o quanto achar adequado - seja 1% ou 100%. Para quem usa celular enquanto dirige, pela proposta a infração passaria de média (quatro pontos) a gravíssima (sete pontos) -e seu valor, dos atuais R$ 85,13 para R$ 315.
A participação em rachas também será mais facilmente punida. Hoje o motorista só é processado se existirem danos materiais ou vítimas e uma delas abrir processo. Com a mudança, a simples participação em corridas ilegais já é crime e o poder público poderá processar o motorista. O ministério ainda pretende mudar a forma de calcular a velocidade excessiva para multar motoristas, além de tornar o excesso infração mais grave. Hoje é considerado um porcentual. Uma infração média, por exemplo, ocorre quando o motorista ultrapassa em até 20% a velocidade máxima de uma via. Se o limite for 50 km/h, isso significa 60 km/h. Mas, se for 110 km/h, o motorista poderia chegar 132 km/h.
O pacote de mudanças nas leis de trânsito também agradou aos magistrados, como o desembargador do Tribunal de Justiça e presidente da Associação Paulista de Magistrados, Henrique Nelson Calandra. Mas ele alertou: "Não é possível imaginar que a simples mudança das leis vai implicar redução das mortes no trânsito. É preciso garantir que elas sejam aplicadas com rapidez." Calandra propõe a criação de cortes de trânsito, nos moldes do que é feito nos EUA. "É fundamental que Executivo e Legislativo dêem aos Estados condições de aplicar a lei."

Pacote de medidas também inclui motocicletas

Para as motos, a principal mudança proposta é a proibição de trafegar entre duas faixas, artigo previsto inicialmente no código de 1998, mas vetado na gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A nova formulação do texto abre uma exceção para permitir que as motocicletas trafeguem entre duas faixas em uma velocidade de até 30 km/h, mas apenas quando os carros estiverem parados. Mesmo assim, a medida deve provocar forte reação dos motoboys, principalmente em São Paulo.



Para especialistas as regras só valem com fiscalização

A sugestão do Ministério da Justiça de reduzir o limite de presença de álcool no sangue dos motoristas - do atual 0,6 grama por litro para 0,3 - é vista com um misto de entusiasmo e desconfiança por especialistas em medicina de trânsito e toxicologia. Apesar de apoiarem a medida, eles dizem que o endurecimento das leis deve vir acompanhado de maior e melhor fiscalização, além de treinamento dos agentes.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Flávio Adura, a ingestão de um copo de cerveja, por exemplo, tem efeitos diferentes em cada tipo de indivíduo, variando conforme a compleição física de cada um. "Entre as novas medidas, a diminuição do limite de dosagem alcoólica terá resultados positivos, mas, ainda assim, deixa espaço para que motoristas dirijam sob o efeito do álcool. Defendemos que o limite permitido seja zero", disse Adura, que ressalta ainda.“Aumentar a punição e imputar sobre o motorista que dirige embriagado - ou que pratica racha - também é um fator muito positivo. O fato de crimes como esses, que podem colocar em risco a vida do próprio motorista e também dos que estão a sua volta, deve ser visto como um grave atentado à vida e punida com todo o rigor necessário" , explica.
A professora de Medicina Legal da Universidade de São Paulo (USP) e perita em toxicologia Vilma Leyton diz que a tendência mundial é a adoção do limite de 0,5 grama de álcool por litro de sangue. "A variação ainda é grande. Na Polônia, por exemplo, o índice permitido é de 0,2 g/l, ao passo que, nos Estados Unidos, alguns Estados estabeleceram 0,8 g/l." Segundo ela, há diferentes interpretações para o que os médicos chamam de alcoolemia - relação entre a quantidade de álcool ingerido e seus reflexos no corpo humano. Para alguns autores, os sinais clínicos e sintomas da embriaguez só aparecem a partir de 0,5 g/l. Outros dizem ser possível notar transtornos clínicos com a ingestão de 0,1 g/l. É consenso que uma lata ou copo grande de cerveja com graduação alcoólica média de 3% contém 9 gramas de álcool. Misturado ao sangue, esse volume representa 0,3 g/l, o suficiente para atingir o limite máximo proposto pelo governo federal. Numa comparação genérica, uma lata de cerveja equivale a uma taça de vinho (de 200 ml) ou um cálice (60 ml) de vodca, uísque ou pinga. Será mantida a possibilidade de o motorista se recusar a fazer o teste do bafômetro, mas sinais evidentes de embriaguez, com testemunhas, serão suficientes para pegar até 3 anos de detenção e ter a carteira de habilitação suspensa.

Dosagem alcoólica

1 lata de cerveja = 0,1 a 0,5 g/l - Nenhuma influência aparente; testes revelam pequenos transtornos clínicos.


2 taças de vinho = 0,5 a 1,5 g/l - Incoordenação muscular; reflexos diminuídos.


3 doses de vodca, uísque ou pinga =1,5 a 3 g/l - Prejuízo visual; andar cambaleante; fala "enrolada" e hipoglicemia


6 latas de cerveja =3 a 5 g/l - Marcada incoordenação; apatia; andar cambaleante.


10 doses de vodca, uísque ou pinga = Mais de 5 g/l - Coma e morte (exceto indivíduos tolerantes)